Acordou as crianças, preparou o café como há muito não fazia. Por instantes pôde sentir o gosto de sexo e cigarro que o café sempre proporcionava ao seu paladar.
Andou pela casa lentamente. Abriu armários. Reconheceu-se nas fotos. Olhou o nome dos livros na biblioteca. Acariciou seus cachorros. Ouviu silenciosamente a funcionária contar histórias da vida. Sentou-se no sofá da sala de visitas. Respirou fundo...
Teve vontade de limpar a casa, retirar a poeira do tempo. Abriu gavetas, jogou papéis, borifou os lençóis com água de cheiro, combinou as toalhas no box e o lençol com a fronha. Remendou as roupas das crianças, limpou os brinquedos, molhou o jardim.
Na cozinha avistou um avental e vestiu-o como se fosse um Dior. Preparou um bolo, fez o almoço, retirou a cebola para um, o alho para outro, fez o brigadeiro do filho, espremeu a laranja para o suco, coou o café. Arrumou a mesa com os pratos de dia de festa, talheres especiais, flores ao centro.
Fez o prato de cada um, quis saber se estava saboroso. Acompanhou o marido até a porta, deu um beijo e desejou-lhe um bom trabalho.
Dirigiu-se para o colégio com o carro que ele escolhera para ela e deu um beijo no filho com gosto de bife acebolado.
No caminho passou na lavanderia. Revistou os bolsos dos ternos, das calças, com o coração na mão, pedindo a Deus para não encontrar nada. Explicou para a atendente como o marido gostava dos vincos na calça.
Voltou para casa, atendeu telefonemas, anotou os recados, ajudou os outros filhos com os deveres.
Abriu os e-mails e respondeu que o marido a proibira de ter um e mail, pediu desculpa para os mais intímos. Apagou nomes na agenda, afinal uma mulher casada não poderia ter amigos homens. E recusou convites pensando que o marido não iria aprovar sua saída nem sequer com sua melhor amiga.
No final da tarde passou no cabeleireiro. Resolveu ligar para o marido para saber se ele aprovaria o novo penteado. Alertou a manicure sobre as cores proibidas do esmalte e da cor preferida do marido. E pagou com o cartão de crédito dele.
Resolveu ir visitar a sogra, tomar um café com a mãe.
Resolveu ir visitar a sogra, tomar um café com a mãe.
Viu um vestido lindo no caminho de casa. Parou, experimentou e pediu para a vendedora reservá-lo, viria com o marido no dia seguinte e o levaria, caso o marido achasse apropriado.
Aninhou a casa para o final do dia. Fez o jantar, deu banho nas crianças, ajudou-o o marido a retirar a gravata. E respirou aliviada por não precisar ter outros compromissos.
Chamou as crianças que brincavam pelo condomínio, entrou em uma rodinha de vizinhas para saber das novidades, aquisições, promoções dos maridos e filhos. Sorriu ao responder para a vizinha que não tinha título, nem sequer trabalho. Uma mulher que vive para a família, pensou o marido da tal vizinha.
Assistiu ao jornal ao lado dele e desejou boa noite para o Willian Bonner.
Preparou as camas, colocou as crianças para dormir, verificou portas, janelas e esperou-o para subir.
Naquele dia ela falou baixo, conteve seus atos, esperou que ele lesse o seu jornal e que explicasse a ela os fatos. Ficou ali admirada com a cultura do marido. E esperou seus beijos, ajeitou-se de quatro como ele gostava e esperou que ele gozasse. Ela sorriu ainda de pernas abertas, úmida e respirou fundo pensando na vontade de ser uma mulherzinha para sempre.
ESLF
Boa noite!
ResponderExcluirParabéns!O blog é muito bom...
Mas não me pergunte como o encontrei...rs
Hoje, no acaso comecei lendo uma citação de Caio F Abreu e de repente me dei conta que já estava 1 hora no blog.
Apesar de chegar “tarde” agradeço sua disponibilidade de tempo e oportunidade em compartilhar diferentes olhares.
Oi Fernandes!!!
ResponderExcluirMuito obrigada pelas palavras carinhosas.
Fiquei curiosa para saber como encontrou meu olhar.
Nunca é tarde, seja bem-vindo!
um bjo