sábado, 8 de setembro de 2012

Meu olhar.




(Patrícia Piccinini colhida por Mauro Homan) 


Poesia, a minha velha amiga... 

Eu entrego-lhe tudo 
a saber: o silêncio dos velhos corredores 
uma esquina, uma lua 
(porque há muitas, muitas luas...) 
o primeiro olhar daquela primeira namorada 
que ainda ilumina, ó alma, 
como uma tênue luz de lamparina, a tua câmara de horrores. 
E os grilos? Não estão ouvindo, lá fora, os grilos? Sim, os grilos... 
Os grilos são os poetas mortos. 
Entrego-lhe grilos aos milhões 
um lápis verde 
um retrato amarelecido 
um velho ovo de costura 
os teus pecados 
as reivindicações as explicações 
menos o dar de ombros e os risos contidos 
mas todas as lágrimas que o orgulho estancou na fonte 
as explosões de cólera o ranger de dentes 
as alegrias agudas até o grito 
a dança dos ossos... 
Pois bem, às vezes 
de tudo quanto lhe entrego, a Poesia faz uma coisa que parece nada tem
 a ver com os ingredientes mas que tem por isso mesmo um sabor total: 
eternamente esse gosto de nunca e de sempre

Quintana 

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